Sem Luz
Te amando na escuridão
do pensamento
como quem toma um drinque
numa tarde de verão...
Olhando nuvens refletidas
nas vidraças dos prédios
Vendo o rosto cinza, dizer
"Ok. Está tudo certo"
Agora eu posso vê-la
flutuando de braços estendidos
sorrindo entre as folhas e o vento
Usando seu vestido branco
com manchas de óleo diesel
apontando o caminho
Mas eu sou um tolo e me distraio
pisando em brasas
Sentindo-me furtivamente estranho
catatônico, te amando
na escuridão do pensamento...
Órbitas
Flutuamos indecisos
Em órbitas tão próximas
Lado a lado
Face a face
Como num carrossel invisível
Até penso que Trotsky
está tocando piano
atrás dos livros na estante
E que a qualquer momento
movida pelos mesmos impulsos
que os meus
você abrirá uma porta
na escuridão profunda da noite
e se jogará sobre o meu corpo
Como o peixe que volta para o mar.
Mamma Mia
Que besteira agora
Ficar pensando
Que eu tenho duas cabeças
Uma que pensa
E outra
que carrega o cesto de flores
Atrás da Pia
F a s e s
Queria que pudesses
dormir em paz no freezer
com seus cabelos pretos
sujos de ranho
esparramados no travesseiro
nesta tarde movimentada de abril
como em tantas outras
infinitas tardes
E depois
sentados a um canto
em qualquer praça
atrás das nuvens
sorrirmos felizes
com a certeza
de que fizemos
tudo o que estava ao nosso alcance
Sem Sentido
Qual o sentido?
O que foi sentido?
Sentido...
Por trás do rosto selvagem
a alma ficou em brasa
E num balé letárgico
os lábios secos quase se tocaram
...Qual o sentido, Lee?
Será que não somos mesmo
capazes de nada?
De um mínimo gesto de minhoca
perfurando as paredes?
De inverter a força
e libertar todo homem
de seu sofrimento mundano?
Não.
Sempre morrerá algum dia
o homem vazio
com cheiro de mijo
que se sentou solenemente ao piano
e não tremeu diante da platéia
Nunca?
Nunca mais estaremos juntos outra vez
caminhando sem rumo
como naquela tarde
em que jogamos beijos aos transeuntes
Olhando para frente
sorrindo para os lados
Nunca mais correremos na chuva
como naquela tarde entre os raios de sol
Naquela tarde em que tanto rimos
e tanto nos tocamos com o olhar
Mostre Seu Rosto!
Havia uma praça escondida com seu nome
em algum canto da cidade
E sua língua brotava na janela
surgindo como o rosto escuro
de um peixe pré-histórico
no mar profundo
Seu cheiro de talco
Sua nota de 500, a tattoo!
Bolha Maldita!
Havia um pequeno sino
sujo de merda de pombo
e um enorme vulto
num camarote invisível
bem às minhas costas
Rua da Linha
Não existem mais
triângulos iluminados
voando perdidos
nas tardes de Saint Tereux
Nem existem mais curvas fechadas à esquerda
Nem sinto o cheiro suave de gás esta noite
em que a lua brilha discretamente
num tom pastel atrás da cerca
Mas ainda estou te amando
voando no tapete mágico do tédio
Enquanto na calçada
homens de terno preto e sem olhos
com dedos sujos e curvos
apontam para a saída
mostrando o fim
já tão próximo a cada um de nós
Aplicações
Aplicações erradas
Onde você estava (?)
Quando eu vomitei chorando
que te amava?
Eu sinto saudades
do garfo empenado nas mãos
do arroto louco
do coração
pulsando como um sapo
no peito pintado de preto
dentro do copo vazio de Coca
Retalhos
...Então eu repito seu nome
seu signo
e continuo seguindo rastros de estrelas
pelas ruas, que já foram mais calmas e perfumadas
E que eram tão lindas e cintilantes naqueles dias
SParkies
Homens revestidos de arame
e garotas descabeladas babando
com gosto de bala
na boca
Vai!
O grande elefante triste
está rodando
deslizando
no absurdo esfuziante
do colorido irreal
(vermelho e amarelo)
Você me ama?
...Então, afaste-se!
Voad a Le Letrone
voando!
Opano branco
Vo-ava
E os talheres tilintavam
sobre a louça árida na cozinha
C i r c o s
Bolinhas azuis...
Não! Escudos...
Pequenos escudos azuis
Ondas crispantes
a se precipitarem com vivacidade
sobre as águas de um estranho lago
sereno e bizarro...
Brilho, luzes
Coisas que se abrem
e se fecham
Se manifestam
Que me chamam
e me instigam
Onde eu me lavo
Vózile Brasi
Assembleia dos Zumbis
brasileños
dos homens magros cabeludos
Rostos marrons
com bigodes fartos
e gestos incertos
Exceto Deus
duvido de tudo
B e v i e e
brevidade fator etéreo
a existir
em todos os objetos
Cultura sem eco
retrógrado no infinito
retangular
dos ouvidos mórbidos
dos que ainda aspiram
ser humanos
Z o r i
Não me obriguem a dizer
a olhar
a opinar
a estar presente
dentro dessa lixosfera...
Estou fora (!)
Fora, bicho!
Fora disso tudo
com minha capinha de Zorro
azul e impermeável
Obsessão (Ambition)
Por que teus olhos
como pedrinhas preciosas
perdidos na noite
cor-de-rosa
Dizendo: "Oh!"
Por quê? Por quê?!
Luz que me levará
de volta àquela casa
no centro dos ruídos
Zino
Realidade é uma situação
que começa existir
mas que nunca se completa...
Sempre há
um momento nenhum...